Ajuda financeira a jovens, incômodo com Cano e apoio de Campello, confira os bastidores da queda de Sá Pinto

“Vesti a camisa do Vasco e vou morrer por ela”.

Com essas palavras, ditas em 15 de outubro ao desembarcar no Rio, Ricardo Sá Pinto prometeu que não faltaria vontade para recolocar o time nos trilhos. Atitudes, como bancar um amigo oculto em churrascaria, e disposição não faltaram, mas resultados ruins e a ausência de padrão técnico e tático em campo fizeram a diretoria optar pela demissão do português que, aos 48 anos, se aventurou pela primeira vez no Brasil.

Sá Pinto ganhou rapidamente o carinho da torcida pelo discurso “pés no chão” adotado em coletivas, principalmente no sentido de arrumar a defesa, que vinha sofrendo nos últimos atos de Ramon Menezes, demitido por queda de rendimento e proximidade da zona de rebaixamento do Brasileirão, posição que o europeu deixou o time. Conquistou o respeito do grupo também na base da sinceridade, algo que é destacado por muitos até hoje.

Desempenho do treinador

15 jogos
3 vitórias, 6 empates e 6 derrotas
33,3% de aproveitamento
Eliminado nas oitavas de final da Sul-Americana
Assumiu time em 13º no Brasileiro e o entrega em 17º

Apesar dos problemas que teve com Fellipe Bastos e Ribamar, jogadores que deixaram o clube após desentendimentos com o treinador, Sá Pinto não deixou desafetos na Colina. Seus treinamentos e métodos de trabalho, porém, não atingiram a todos. Muitos não assimilaram e se queixaram da falta de variação de peças e de esquema.

Outros enxergaram no português pouco conhecimento a respeito do futebol local. Tanto em relação aos jogadores do Vasco quanto sobre os adversários. Câmeras flagraram o lateral-direito Léo Matos dizendo ao treinador que o atacante Gustavo Torres não sabia jogar “de costas”.

Ao ver que o grupo não falava mais a mesma língua, Ricardo sempre os protegeu e ganhou respeito ao tomar a frente do elenco diante de uma invasão feita por parte da organizada Ira Jovem no último dia 10.

– Pela minha felicidade e digo de coração: não vejo essa gente a facilitar em nada. Durante a semana no trabalho, na alimentação, no descanso e na vida privada. Tenho um grupo fantástico – disse aos torcedores.

Embora nem todos aprovassem seus critérios para escolha de peças e sistemas, o elenco valorizou a atitude do português.

Amigo oculto em churrascaria na conta de Sá Pinto

Em mais uma tentativa de aglutinar os jogadores, Ricardo Sá Pinto bancou, no último dia 22, ida do grupo a uma churrascaria na Barra da Tijuca, onde foi organizado um amigo oculto. Detalhe: mesmo sem ter recebido nenhum centavo do salário acordado – o atraso referente a outubro, novembro e dezembro também atingiu o auxiliar Rui Mota, o preparador físico Miguel Moreira e o analista Igor Dias.

Foi o último movimento em prol de união feito por Sá Pinto, que já havia promovido dinâmicas de grupo e conversas individualizadas, antes da demissão.

Aliás, esta não foi a única vez em que mexeu no bolso para ajudar o Vasco. Chegou junto com dinheiro diante de jovens que passavam por dificuldades financeiras.

Critérios questionados e incômodo com postura de Cano em campo

Dentro do grupo, alguns fatores causavam incômodo. A escalação, por exemplo, às vezes era passada ao grupo no dia das partidas. As constantes mudanças também eram alvo de críticas.

Houve também uma reclamação interna em função da previsibilidade de Sá Pinto em relação às mexidas. Jogadores eram avisados antes dos jogos que entrariam no decorrer das partidas, e outros, consequentemente, percebiam que seriam preteridos.

Uma opinião polêmica de Sá Pinto é de que o português via em Germán Cano um atacante com pouca contribuição para o time, já que este de fato não é peça participativa na recomposição defensiva.

Caso de Covid atrapalhou trabalho

A atuação no empate em 1 a 1 com o São Paulo, líder do campeonato, no Morumbi, é tida como uma das melhores do Vasco de Sá Pinto. Depois desse jogo, o português testou positivo para a Covid-19. Teve de se ausentar por 10 dias dos trabalhos no CT, o que prejudicou a evolução do time.

Não viajou a Argentina, para o jogo de ida contra o Defensa y Justicia pela Sul-Americana. No retorno, a equipe voltou a oscilar e fincou pés no Z-4.

Campello é o último a desistir de Sá Pinto

Quando a pressão se tornou insustentável, principalmente após goleadas sofridas diante de Ceará (4 a 1 em casa) e Grêmio (0x4), o presidente Alexandre Campello segurou Ricardo Sá Pinto o quanto pôde.

Até o vice de futebol José Luis Moreira, também português e um dos responsáveis pela contratação de Sá Pinto, jogou a toalha antes de Campello. A instabilidade política, cujo auge ocorreu na eleição, também surpreendeu Sá Pinto.

O português, após a Justiça referendar a eleição de Jorge Salgado, concordou que o próximo presidente fosse ao CT falar com os atletas. A ideia era passar tranquilidade e atualizar a atuação para pagar salários atrasados. Campello levaria o seu sucessor, mas um fato desmarcou o encontro: o falecimento do pai do atual presidente no último dia 23. Sá Pinto não gostou de o encontro não se remarcado.

A transição no futebol do Vasco só aconteceria na posse de Jorge Salgado, mas o furacão provocado pela derrota por 3 a 0 para o Athletico-PR, sem qualquer resistência, acelerou as mudanças e encerrou a passagem do lusitano pela casa mais portuguesa do futebol brasileiro.

Se Ricardo chegou com a fama de Coração de Leão, em campo seu time nunca rugiu. Apático, ruiu com três vitórias em 15 jogos (além de seis empates e seis derrotas), e Ricardo caiu.

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