Vasco tenta usar artigo da lei do clube-empresa para diminuir efeitos da execução das dívidas

Tradicionais camisas do futebol brasileiro, Botafogo e Vasco se acostumaram a acumular crises nas últimas décadas. As temporadas irregulares, causadas pelas más gestões, colocaram a dupla carioca novamente na Série B do Campeonato Brasileiro nesta temporada, uma das mais equilibradas dos últimos anos. Como nada é tão ruim que não possa piorar, nas últimas semanas a Justiça determinou o pagamento das dívidas trabalhistas dos clubes pelo Regime Especial de Execução Forçada (REEF), pegando de surpresa as agremiações. Agora, ambos tentam se valer de um dispositivo da lei do clube-empresa para gerir seus passivos por meio do regime de centralização e evitar um colapso financeiro.

Segundo o Tribunal Regional de Trabalho do Rio de Janeiro (TRT-RJ), o REEF é um “procedimento unificado de busca, constrição e expropriação de patrimônio”, e tem como objetivo acelerar o processo de adimplência de um devedor com todos os seus credores. A brecha para a execução das dívidas de Botafogo e Vasco foi a exclusão, em maio, por falta de pagamento de parcelas, do Ato Trabalhista — medida que evita a penhora de receitas e permite a quitação a longo prazo, de forma ordenada.

No dia 17 de agosto, data na qual completou 123 anos, o Vasco foi executado em R$ 93,5 milhões. A decisão foi assinada pelo juiz Fernando Reis de Abreu, gestor de centralização do TRT-RJ. Em nota, o clube afirmou que a medida “pretende decretar o encerramento das atividades” do clube. Entre as fontes de pagamento citadas estavam a penhora direta de R$ 24 milhões do contrato de direitos de transmissão com a Rede Globo. Dois dias depois, foi a vez do Botafogo ser alvo do regime, em R$ 85 milhões.

Entretanto, ambos conseguiram a suspensão da decisão, tendo como base a lei do clube-empresa, sancionada em agosto pelo presidente Jair Bolsonaro. “O REEF não decreta a nossa extinção, mas torna a gestão mais difícil. Porém, entendemos que essa decisão conflita com o escopo da lei. A forma de enfrentá-las (dívidas), estruturada, alocando percentual da receita, já foi homologada por lei”, diz Jorge Braga, CEO do Botafogo.

De autoria do senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG), presidente da Casa, a lei cria o Sistema do Futebol Brasileiro, com a tipificação da sociedade anônima do futebol (SAF). O texto tem como um dos principais atrativos permitir o financiamento dos clubes por investidores, mas também versa sobre a possibilidade de equacionar dívidas por meio do Regime Centralizado de Execuções (RCE) sem a necessidade da criação de uma SAF. “É um conceito moderno que acreditamos que deveria ser aproveitado”, afirma Braga.

A possibilidade de ingressar no RCE foi observada pelo Vasco rapidamente, com o clube entrando com um requerimento no dia seguinte à sanção da lei, o primeiro no Brasil a fazer o pedido. O documento foi apreciado no TRT-RJ pela desembargadora presidente Edith Maria Correa Tourinho, reconhecendo o direito do cruz-maltino, mas sem a análise da suspensão do REEF em um primeiro momento, pois a competência do assunto estava com a corregedoria do tribunal por se tratar de um ato normativo da Casa. Posteriormente, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) reconheceu a competência da vara, que suspendeu a decisão, estendendo também ao Botafogo.

“A centralização das dívidas, que é regulada pela lei federal, é completamente incompatível com a execução forçada. Como um clube vai elaborar um plano de pagamento de credores se enquanto isso ele for executado de todos os bens que ele tiver?”, diz José Cândido Bulhões Pedreira, vice-presidente Jurídico do Vasco.

Os clubes têm 60 dias para apresentar um plano de pagamento ao TRT-RJ para obter a validação da centralização das dívidas. Em contrapartida, as agremiações vão destinar 20% de suas receitas mensais para pagar seus credores. Diferentemente do Ato Trabalhista, a lei do clube-empresa permite que os passivos sejam pagos em até seis anos, com a possibilidade de extensão por mais quatro. O uso de recuperação judicial também torna-se viável, mas tanto Vasco como Botafogo acreditam que a primeira opção seja a mais adequada.

“A centralização também é a melhor saída para os credores. Uma recuperação judicial é mais traumática, com credores sem receber durante um ano durante o processo, com descontos altos nos valores dos créditos”, comenta Bulhões. “O Vasco é muito viável. Segundo nossas projeções, a gente quitaria a dívida trabalhista no prazo de seis anos”.

Visando uma retomada do protagonismo no futebol, a dupla também espera constituir uma SAF para atrair potenciais investidores, mas admite que os vetos do presidente relacionados ao Regime de Tributação Específica descaracterizam a ideia inicial do projeto. Os trechos deixados de fora da lei ainda voltam ao Congresso e podem ser derrubados ou mantidos.

Enquanto as diretorias trabalham nos bastidores, as equipes seguem na luta para voltar à elite do futebol brasileiro. Nesta terça-feira, o Vasco enfrenta o Goiás, fora de casa, às 19h. Com 32 pontos, o time precisa vencer para se aproximar da zona de classificação na Série B. No G-4, com 38 pontos, o Botafogo volta a campo no sábado, às 16h30, contra o Londrina, no Engenhão.

Fonte: Estadão

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